Os recados do espelho – Crônicas do Brasileirão (36/38)
Flamengo 3×2 Inter. Fim da série invicta depois de um jogo que o rubro-negro abriu 3 de diferença em um primeiro tempo desastroso e “consertado” no segundo pelo Colorado
A mínima chance do título brasileiro se esvaiu, tal qual diria Roy Batty (interpretado pelo brilhante Rutger Hauer) em Blade Runner, como lágrimas na chuva. A citada pré-candidatura ao título nacional, citada nesta coluna no domingo passado contra o Bragantino, findou-se neste domingo (1º) em uma partida pra lá de especial feita pelo Flamengo no Maracanã, demonstrando a força de seu elenco com mais de 50 mil pessoas no Maracanã com as grandes atuações de Gerson, Michael e Wesley. Não apenas para “responder” ao título libertador do rival Botafogo, mas pleiteando que em 2025 o Flamengo continuará na trilha dos grandes títulos que retomou ao conquistar a Copa do Brasil há poucas semanas. No lado vermelho e branco, em um primeiro tempo quase irreconhecível, o Inter já apresentava sinais nada positivos e desmanchou-se depois do gol de Léo Ortiz, invocando o artigo 1° da Lei do Ex, após escanteio aos 30 e poucos do 2º tempo.
Para quem contava com um trauma daqui a um domingo (ou na quarta-feira), dessa vez ele veio de forma pasteurizada (sic). Em meia hora do “meio-tempo” – expressão usada por mim para designar a junção da metade final do primeiro tempo e a metade inicial do segundo – a atuação deluxe dobrou a intensidade após o primeiro gol com mais dois de Michael – carrasco colorado desde os tempos do Goiás em 2019 – mirava uma goleada histórica. O que havia de ser o fiasco colorado da era Roger até Enner Valencia achar Wesley que, de fora, uma panca para diminuir. O próprio Valencia depois cravaria o seu no Maracanã para chegar ao 3 a 2 e então Rodrigo Pereira de Lima emulou, junto ao VAR, a mesma esfriada de jogo que Patrício Loustau fez após o gol de Rodrigo Lindoso nas quartas da Libertadores de 2019. Apesar de alguns ameaços e chutes que poderiam ter levado ao empate, paramos por aí e, satisfeito, o Flamengo também amornou o jogo o suficiente para conquistar a vitória e celebrar a penúltima dança de Gabigol.
No nosso caso, o vexame foi evitado mas a derrota não. O que não abona as partidas ruins de Bruno Gomes, Bruno Tabata, Rogel e Thiago Maia e, em menor medida, Alan Patrick e Bernabei, os destaques do time em 2024. O ritmo de jogo do Flamengo já tinha sido forte o suficiente com um time misto no Beira-Rio e aumentou ainda mais hoje com o já citado Michael e também Nico de la Cruz, que fez boa apresentação. Wesley fez uma boa partida mas cansou. Dos destaques positivos vindo à campo, Rômulo mostrou interesse na partida e mais vitalidade que Fernando, que foi envolvido pela velocidade do meio-ataque flamenguista.
Não somos a rainha má da Branca de Neve ou o Seu Madruga às vésperas de sua mor- digo – de seu aniversário, mas o espelho, já mirando o futuro que recomeçou hoje, nos deu duas mensagens para 2025. A primeira, de que fizemos por merecer uma vaga direta na Libertadores do ano que vem, depois de uma temporada tumultuada e destroçada que fez o clube como um todo se ver em péssimos lençóis. Mirar título era loucura, mas sobretudo uma expressão do joie de vivre preso no coração de cada torcedor colorado. A segunda, foi que nós, no ano que vem, teremos que cortar um dobrado para tentar chegar no mesmo patamar de Flamengo, Palmeiras e Botafogo. É necessário continuar o incremento que se fez em 2024 e buscar alternativas para financiar o saneamento das dívidas e com mais divisas investir mais do que em apostas (como foi a de Wesley, que nos rendeu 11 gols neste Brasileirão). Mesmo num cenário em que um plano de financiar as dívidas do clube, através do plano da emissão de debêntures, virem na boca de um ex-presidente do Conselho Deliberativo algo como financiar a eleição de sucessor do presidente Alessandro Barcellos.
Todavia, é necessário ter as prioridades em mente. Voltamos a um cenário com três competições em um ano com um calendário que é mais apertado que transporte público em horário de pico. Infelizmente, é necessário abdicar de uma das copas, ao meu ver, para chegar e vencer a outra. Como o Inter já está na terceira fase da Copa do Brasil por participar da Libertadores, creio que a nossa copa nacional deveria ser colocada em segundo plano. Até porque estamos, tal qual todos os outros 32 que começarem nos grupos da Glória Eterna, a 13 jogos de conquistar o tricampeonato da América.
Ainda faltam dois jogos e o jogo contra o Botafogo no Beira-Rio pode significar o tricampeonato brasileiro do time que já ganhou a Libertadores no fim de semana. Seria um final melancólico de ano justamente por não ganhar títulos importantes há 15 anos e nem um Gauchão há nove. Mas só há uma saída para quebrar esse tipo de prisão que só os jejuns fazem com a gente: tendo capacidade e (in)sanidade o suficiente para levar essas secas à nocaute. Enquanto isso, la nave va.
Tiago Pereira Lumertz